Archive for julho, 2008
(são uivos relatados)
ancestral perverso desta fuga,
arredondada paisagem do inferno,
este caminho é pleno de relatos.
saber-lhe os uivos, que mais for, saber
o elo da montanha que lhe brusca
um último estandarte desta voz.
que mais trazer o pulso, uma verdade
corrente noite, ilustre madrugada,
um passo de caminho, uma afoiteza.
tonitroamentos todos são solenes
uivos relatados, que outros uivos
só podem rastejar num corpo alado.
de tudo o risco na pedra vai dizer
a poesia em seu instante de pedra.
barracos desmontam um memória do ferro.
quando, amplamente, falamos da vida
murmúrios regaçam nossas almas malditas.
somos a face de querer ser noite.
(a musa carece de minguante)
recarregar de asperezas o corpo.
a manhã faz tempo ser espinho,
se outra novela não disser do outono.
quando, cruel viela, direi que outro
foi o campo vital da minha dúvida?
quando, noite passada, farei sono
ser mais que soturnez?
tanto mundo se mostra pedra
se facas regateiam nacos.
entre poetas
essa menina bonita
tão bonita que me mata
é filha de um certo luís
com uma tal de renataessa menina, ai de mim!
inteligente e formosa
é filha de um bandolim
com uma mãe amorosapra findar esse versejo
e controlar o meu ai:
essa menina não engana
é mesmo a cara do pai.(para a bibi, poeta)
eu, bravata de estalos
se instante fosse luz, quase somente
estado se faria, e eu, entrevado de voz,
escaparia pelas frestas.
remendo e vértebra
os calos detrimentam meu estrato.
a pele, osso e pedra, é solta em rebordosas amplas.
viveres e pontes cabem meu caminho
como as amplitudes recaem sobre nós.
olhando o espasmo, meu relincho dorme.
os homens neutros, os rios neutros,
se despedaçaram.
sobrou de tudo a última trompa.
se muros fervilharam, outros muros cabem
como estampas nos rins e coração.
a construção do novo, breve aura
no olho vê-se, brusca.
quando etapas rangerem, vou rever meus antros.
cancela do mundo
venho de longe
venho de léguas
sou de botas largas, sertão seco,
de couro rasgado a músculo teso.
meu rosto, largo
das terras que passei.
meu olho, múltiplo
de atalhos e pinguelas.
o mundo é a pátria.
encanto adjacente
eu quero carregar a tua sombra
como lastro do olho que me habita.
quebrada paz de ouro preto
scliar:
arder em ranço a noite de ouro
preto. paz quebrada de cansaço;
um canto rende-se no canto: vesgo
a vesgo. caso fôra, por que mais?
quando bichos hão de lavrar a
cidade? ela escalpela e mata, fuga
das gentes. pedras pisam corpos
que lhes pisam. nesga de igreja lhe
requebra o olho. arcos rendem
nossa ilusão.
rompida a cal da terra, esta nos faz
um gomo massacrado.
XLIX
se de repente te olho
na transversal do meu sonho
bebo delírios aos montes
de 4 em 4 te ponho.
vejo curvas, horizontes
sem linhas horizontais
e a mente crespa desfolha
poemas e bacanais.
minha doce face fuzilada
Sou, por meus inteiros, vários.
minhas frações se fazem de repente.
o olho, de inteiro e faces,
disseca os cacos da manhã (lavada).
múltipla mão, da luz, me regurgita
uma estranha verdade, um denso espanto.
tua ausência solta
tua face é tanta e tão ausente
me cala o corpo agudo em tal instante.
(toda a pele do homem)
terras e águas, meu ávido destino,
lusco-fusco de cansaço na noite.
belzebus tardios lufando prumos,
estandarte de rito feito treva.
se, babilônia no peito, os azares
— fatídicos e atávicos azares —
acalantam os poços da memória,
só o banal do vento tem destino.
saber mais, se o tempo só, em água
percorre o assobio da treva.
um ananás alimenta aves no escuro,
um tanque de melados devaneia.
— quando carne se revela em açúcares,
a pele do homem, toda, é uma noite.
ser a carne do corpo, ser o corpo
ser a carne do corpo, ser o corpo
atrium de quantas almas. ser
o resultado do anúncio das marés,
ser o mais manhã desta manhã.
entre outros, carimbar todos os muros
com a palavra chave, intumescida
de sentido, quando os homens reverberam
sua carne na noite tão aguda.
a carne do homem pode mais que o homem
se lhe for dádiva do tempo. pelo corpo
pode sangrar um soluço só retido
nas multidões que antecipam o tempo.
se o mundo ensandecido sobrar, louco,
figuras vão lhe trazer piedades.
ora, só facas sabem-lhe a metade
do corpo recurvado de poesia.
cicatrizes lhe vão falar por sobre
a miséria dos tempos. tão agudos
os corpos hão de vir mais do que todos
trazer-nos sua última palavra.
por meu amigo
meu amigo scliar lá se foi.
quando olhei seu corpo, não estava.
quando olhei seu olho, já não via.
quando firmei sua mão, já não pulsava.
quando detive a tela, já não tinha.
quando mirei seu rosto, puro intento,
me coube a vida de dizer-lhe só.
da sua mão parada, meu tormento.
quedou-se amargo, o meu corpo, pró
o que ele fez da vida. e sinto
seu extrato por um vidro: pó.
Casario – Carlos Scliar
posso regar a noite de auroras
posso ser vento e água numa noite.
poeta é fogo de esgarçar vitral.
opera um açoite, quando o tempo
sonoro se arrefece num arregalo
de medo e uivo. dor, tormenta
será o que sobrar nesta cidade.
dardos por olhos, sempre desfibrados
calentam a timidez de certos corpos
no ruído da mão, sempre latente.
— há verbo que se faça sobre nós?
Oh! Que estúpido fui!
Quebrei minha panelinha literária
no dia em que nasci.
Voaram cacas, caquinhos e cagões
fedendo como nunca vi.Desde então sou poeta solitário
corajoso, forte e temerário
orgulhoso pra caralho
mas no borralho.Quem me empresta nova panelinha?
Quero que me puxem o saco.
Exijo ser chamado gênio.
Preciso cagar regras.Ai que saudades de uma cagadinha
na minha literária panelinha.
Sebastião Nunes
(genealogia)
tantos inácios são, tantas joaquinas
solteirões e loucos, batizados,
sem batismos outros, totais crismas,
corpos sem osso quase, quase irmãos
casados como dia e noite casam.
tantas mulheres, anciãs, tantas celinas,
de armas, punhos, dentes, tantas almas
cistas do céu como se fossem linho
tirado de 200mil lençóis.
tantos pinicos, cavalos, boiadais,
éguas, potrancas, potros, crioulos
que são potros e éguas e cavalos
e sumorejam a terra com seu sangue.
mais outros sangues, tão malditas mãos,
outros que tantos, tais são desencontros
de ativar a boca vil da pólvora
e remeter seu hálito cinzento
contra a maçã-de-peito de qualquer.
o poema
é texto de palavra atada e fugidia.
rasgo de alma, fosse chuva e sol.
como o pai tive martelo
falo linguagem
do povo sertanejo:
inté, isturdia, trabanda
me são de família.
avô zico
sou manso de brabezas. advindo.
conto o nascido na precisão do cerrado.
certo, dirás: falências. que não. vô zico
foi anunciado nos garimbos. removeu
caminhos de água. tentou se recompor
com diamantes. daqui não deu. risco
em cedro e pompéu. de seis fazendas
sobraram-lhe tesouros. de corpo interno.
onde a lua faz clarão
De Angelino Oliveira, ouça Tristeza do Jeca, com Renato Braz
opará
sempre que vou ao recife e vejo seus rios, penso: são os rios do joão cabral. capiberibe, beberibe.
e, de alguma forma, acho graça: o meu rio é maior que os dele. o são francisco.
em alguma coisa eu quero ganhar do “poeta maior”.
o tempo se trabalha por corpos
estar e ser são textos do momento.
há um caudal de tempos intrincados
que se revelam no quadro de um só tempo.
Sangue espesso, vida espessa, rio espesso
Aquele rio
está na memória
como um cão vivo
dentro de uma sala
Como um cão vivo
dentro de um bolso
Como um cão vivo
Debaixo dos lençóis,
debaixo da camisa,
da pele.Um cão, porque vive,
é agudo.
O que vive
não entorpece.
O que vive fere.
O homem,
porque vive,
choca com o que vive.
Viver
é ir entre o que vive.O que vive
incomoda de vida
o silêncio, o sono, o corpo
que sonhou cortar-se
roupas de nuvens.
O que vive choca,
tem dentes, arestas, é espesso.
O que vive é espesso
como um cão, um homem,
como aquele rio.
João Cabral de Melo Neto
(para affonso romano de sant’anna)
não acredite na suavidade dos poetas
cujos versos,
por simples,
são um cavalo em pêlo, no cerrado.
(fuja do poeta
como se foge da doença que se estampa longe.
seu fígado é visgo:
nada lhe corrói as entranhas.)
os aços mais duros
não conseguiram lhe desmontar as peças.
seu olhar, sempre sobre,
há que ser medido em trovões.
um poeta qualquer, por mais frágil,
faz terremotos parecerem grilos.
(a estranha essência do poeta)
ampla de luzes
quisera descrevê-la como candelabro.
amplas luzes de braços, arrebatados,
lâmpadas.
alma em tormenta, seu fogo interno
abre valos.
quando nela rasgo, carrego no corpo,
puro arco. seus olhos, faço luzes,
sobrancelhas do mundo.
dentes em mordedura aberta,
um sacramento da carne.
quando múltipla, me esbravejo em farelo.
quando dizer recai, estremecido, no alvo
desmontar o verbo infiel,
caridade maldita, praga estupefata.
o gesto de palavra pode ser
algo inserido entre tumulto e mão.
tempo
minha idade é impronunciável.
no tempo,
no máximo serviria para dizer por quantos sábados
eu poderia dizer a oração de vinícius
e cometer coisas não aceitas,
“porque hoje é sábado”.
também serviria para instalar os domingos
da minha vida, onde, por impaciência,
pouco me sobra.
adros ancestrais
quero ser forma, extrato, pão de circo.
ter corpo arruinado nas paixões
mais sôfregas do homem, corpóreo
advento sobressalente do tempo.
flecha e raio
quanto de homem trago no meu corpo?
e quanto sou de bicho na manhã?
sobre o meu corpo arrasas mansidão
se pouco te disser da noite brusca,
do teu relevo em mim todo ele espanto,
chaga, poder, ditongo, dissonância,
escada de relato, alvo de potros
se lábio tens, quebranto, alvéolo meu,
de pura mansidão, latido louco,
sobre o meu corpo arrasas mansidão.
tão tempestade, dizer meu braço teso.
Marlene e seus amiguinhos
Por Beatriz Nassif
A Marlene (babá), tem uns amiguinhos. Váááários amiguinhos.
Uma vez, ela estava pegando as folhas que caíram da árvore. Então, ela sentiu uma coisa gosmenta e verde. Quando viu, sabe quem era? Isso, um de seus amiguinhos. Mas que amiguinho? Uma rã. E os gritos eram tão altos que a rã pulou e foi embora! Ufaaa!!! Mas que nojo!!
Alguns dias depois, Marlene estava pegando o saco de lixo pra dar pro caminhão de lixo. Então ela viu que o saco estava rasgado. De repente….. Ela sente uma coisa gosmenta e mole. Quando ela vê…… É um de seus amiguinhos. Esse amigo é o rato. Um rato gordo, mole e gosmento. O filho Marlene, Elisângelo e o motorista (que agora trabalha na Dinheiro Vivo) Alex morrem de rir (modo de dizer). Marlene dá uns berros e o ratão vai embora. Ufaaaa!!!
Um tempo depois, Marlene está lavando a sua louça quietinha, na boa quando o Alex diz “ Marlene, olha essa lagartinha” e Marlene responde “Ahhhhh”. Era uma centopéia.
Depois, Marlene estava limpando não sei o que e uma lagartixa caiu em cima dela. Ela gritou “Ahhhhhh”. Ela esqueceu que estava em cima do banquinho, pulou, caiu e se estrangulou. Ficou toda roxa e vermelha.
Outra vez, a mamãe estava penteando o meu cabelo e a Dora estava esperando. Marlene estava preparando o café. E de repente… PUM PUM PUM. O que será? Um bichinho sai do fogão. É um dos amiguinhos da Marlene. É outro rato. Ela senta na cadeira e o rato volta pro fogão. Ela pega o telefone e liga pra mamãe. O telefone toca. “Renata, tenho companhia aqui embaixo”. “Tem um blablá aí em baixo?”. “Tem”. Nós descemos. A Dora ainda estava com o cabelo despenteado. A gente pegou a Laurinha (cachorra) e enfiou na cozinha. Ela não fez nada. Acho que ela nem sabia que o rato estava lá. Tiramos-a e colocamos-a de novo. E nada acontece. Nós ligamos pra amiga da mamãe (Adriana) e contamos o que aconteceu e ela deu a idéia de ligar pro Angelo porque ele mata rato. “Angelo! Cê tá chegando”. “Por que?”. “Porque tem um rato no fogão”. Eu já tô chegando”. Um tempo depois “Angelo, cade você?”. “Eu tô na Cardoso”. Um tempo depois, ele chega e entra na cozinha. Começa a balançar o fogão. TUM TUM TUM. O rato sai do fogão. Mamãe dá uma espiadinha e depois fecha a porta. O rato corre pra lá e o Angelo também. O rato agora corre pra cá e o Angelo também. O Angelo pisa na cabeça dele de levinho, pega a vassoura traz um pouco mais perto e CRASH. Deu até pra ouvir. Ele quebrou a cabeça do rato (sem modo de dizer). A Dora penteou seu cabelo e fomos pra escola.
Ontem (25/10/2007), a Marlene foi abrir a janela e regar as plantas quando definitivamente uma lagartixa preta pulou do vaso direto pra Marlene. Ela pulou mesmo, ela não caiu, ela PULOU. Marluce (sua irmã) diz “Que fofa!”. E Marlene grita “Ahhhhh”. Ela balançou tanto o corpo que a lagartixa caiu.
Quantos amiguinhos, hein!
trago margens de rios
eu,
que sempre namorei fantasmas
só hoje lembro.
marchei por terras planas:
lama e poeira, essência.
por rebeldia, montanhoso,
nervo íngreme.
sangue vulcânico do passado passado.
abismos da memória me teceram
a pele.
anteontem quiseram mais
ontem, o través me trouxe. deixou-me
mudo, como que sangue. fiz-me em folha.
tudo começou pela noite
martelos são macios se levados
ao fogo da paixão e perquiridos.