Archive for fevereiro, 2009
ventania
patrícia tem a voz enovelada
baixa, baixo profundo, adjacente.
patrícia tem a voz de madrugada.
tempo
minha idade é impronunciável.
no tempo,
no máximo serviria para dizer por quantos sábados
eu poderia dizer a oração de viníciius
e cometer coisas não aceitas,
“porque hoje é sábado”
também serviria para instalar os domingos
na minha vida, onde, por impaciência,
pouco me sobra
quando restar, espero-te
quando do esquálido de mim te faz em chamas?
quando, entranhas frêmitas, me fazes no teu corpo?
se estatelas de vez, de tão bem-fadada,
mão de estremecido gesto, me relatas.
ficam-me tuas sobras.
caminhas nuvem alta na manhã.
tua face me redime o tempo. o campo
do teu gesto, a fala da tua fala, densamente
me dormem.
a mondrian, sem lhe dizer, palavra
quente frio, em pele.
— nus da manhã
— nus de qualquer aragem
— nus de todo apodo
jazem sobre o quadrado,
osso de todo o rosto.
sobrados são
— mondrian —
calças, meias, aragens.
o pêlo puro, resto essencial,
é a fala.
a pantera
a fresta da pantera, uma lacuna.
o olho arranca coragem.
seu riso tem lábio de sangue,
presa de cio breve.
a mata lhe solta as vertigens
e os dias
entre rasgos de espadas, seu passo.
ribombo da garganta soa podres.
o dente esava a carne. a morte rompe.
a vida se revela.
poeta e noite
fênix:
a partir das insônias, fiz.
poetas são malditos e no espanto
de revelar limites se martelam.
há um poeta assim, em cada canto,
no redemunho do espanto que revelam.poetas são em pétalas, cruéis
com tintas destiladas pela mão.
os dedos se arrebentam em pincéis
drogados pela cor da solidão.tão bêbados de tudo, estes poetas
de ansiedade e insônia vão tomados.
ao percorrer as noites pelas frestas
poetas são destroços renegados.
por joão cabral
sempre carrego um rio.
margens de atropelo, ilhotas ávidas
conduzem a água apertada.
sobra-lhes um derivar de peixe,
um corte do corpo do peixe,
a lama escorraçada.
o uivo do rio treme de pedra
e se estatela azul.
quando arcos sobram entre os dedos
o devaneio é morto.
o rio se abate como cão sem plumas.
gesto metálico, noite
desmontar o verbo infiel,
caridade maldita, praga estupefata.
o gesto de palavra pode ser
algo inserido entre tumulto e mão.
quando dizer recai, estremecido,
no alvo, a noite se caminha poldra.
alice, avó
avó alice tinha como lide
mostrar-se sempre em traços de senhora.
pisar terras, deixar gados, ancestrais
de relevância em estirpe se dizer.
mais que dizer, fazer-se em relevância
inda tangente de tempos bem atrás.
porque alice, de terras, só lembrava
umas vazendas torpes, vaus de rios.
e quando rios se mostravam, tão varões
de antanho, carregados por diamantes,
é que alice por pulso refazia
seu desalinho, em mostra de importâncias.
tamanhas terras, gados, éguas, pratas
diziam restos de alice, tudo
o que se diz da posse, do libelo
da vida conseguida a foice e tiro.
contornos de fazenda são delitos.
a manhã faz tempo ser espinho
manhã flagelada do destino,
marcas de dedo em sua nuca podre
fazem banana e tempo serem unos.
o mel lhes come a face, repentina
face que encadeia luz. ritmos
e brasas cantam como dedos,
lavra infiltrada de só menoscabo.
o óbvio do pêlo, umas membranas
atadas de nervo e amargura,
esta poesia, clausura e hábito,
de gelo nas veias, água e podridão,
fechada nos resguardos da noite,
solidão tesa
apressa a mão em distúrbios.
quanto dela, incendiada, vê o homem?
travado em pergaminho e vilarejo
um hábito de luz corrói seu tempo.
o meu extrato de pedra, a minha nuvem de atos,
obscurecem frio e madrugada.
corpo indigente permeia tempestade,
valo de luzes, contrição de medo.
as madrugadas fazem como lã
o ritmo da estrada, ovelha e pasto.
intenso e belo estado putrefato
do corpo! emoções me causam
um estardalhaço de anões na alma.
a cumiada do olho
se tua manhã fosse avessa
nem moitas lhe sobravam.
o mais breve dos anjos tem um justo sono.