Archive for maio, 2009
só o tempo desliza
sou fátuo, de passagem, companheiro,
com doce riso a assobiar maçãs.
corpo assombrado de imagens, umas bielas
tardias que se fazem soltas.
se o corpo é redemunho, o que me assola a alma?
se o corpo é um dentro, o que trará?
posso regar a noite de auroras.
verbo em alavanca
chuva fala do olho.
ciscos, tamancos da alma, dizem
ser o mundo meu estado e manhã.
sobrava-me, no olho, o vesgo do teu hálito.
quando cismas, explode o mundo e o verbo
em alavancas.
bagagem
trago
uma secura no meu lado direito
que me proíbe de vender bananas.
trago
um martelo, tonel de badalos
que me safira e empresa os olhos.
quando milhos, tenho tantos
que me encarrego do tombo.
a sutil faca me faz anacoreta.
as putas
as putas surgem na manhã, encruzilhadas
de corpo e ato, verdade que refreia
o noturno das almas.
cada corpo e olho trazem demandas
impulsionadas nas veias.
muitas extirpam a dor. outras, dor
já amada, fazem daquilo seu tempo.
e a mulher é lava adolescente.
se vista à necessária distância
seu pulso vive como antro de larva
em repulsa da mão que lhe percorre.
dilaceradas, lhes sobra um mundo vesgo.
(intima, sua luz refrega substância.)
as putas ferem a noite com um olhar de luz.
vermelhos, sabem quando a cama resvalada
pode ser vista dos ângulos.
sabem-se frutas tão nascidas quando
ressecadas
e a prenhez de suas valas cabem, de mãos,
toda a terra.
o homem furtivo lhes deriva a noite
como canto. quando o estalar da terra
fala, um novelo contém o corpo.
há que tocar o novelo, feri-lo e resguardar
seus montes.
o objeto de mim
teu encanto é de pedra.
teu olho, a paridade do ovo.
teu caminho, o lastro do espaço.
se vieres, direi do teu instante,
pisarei teu reflexo como estado do corpo,
transporei a vila como são transpostos
as peles e os bichos.
e de ti, estado, farei o objeto de mim.
qualquer cão passado saberá deste ato.
louco, cimentado *
o meu cabelo é louco, cimentado
por cabedais em tudo transparentes.
carrego umas vogais de acessório
pra desditar poemas de indulgência.
o beijo, amigo, é a véspera da fome
que nos percorre: josés, joões, sem nome
sem consoantes uns, consonantados
outros. bêbados, invertebrados
da sanha do mundo. ruidosos calos
nas mãos de enxadas e assobios
suas visões são uns caudais de rios
que regam o mundo todo de abalos.
numa aparência louçã, insandecida
vou rebelar a noite de vestais
nuns sobremodos de maus modos tais
que até a morte vai se ver na vida!
* Do livro Per Augusto & Machina, a ser lançado brevemente