Posts filed under ‘Manuelzão’
quero dizer que manuelzão foi boi – II
o texto é naufrágio e é silêncio.
quando da pedra salta-lhe uma cabra
seu dia contado vê-se rubro.
a pele vermelha do ar solta-se
em vigores. uma poesia carrega
sempre outra. cada grão avalia
o extrato como podre. querelas
são fontes de desejo. e os desejos,
noites.
preso dos olhos, manuel é cumieira.
quero dizer que manuelzão foi boi – IX
onde o instante da vaca é universo
onde o estado do boi pode caminho
a rua do seu corpo é só poeira
o valo do seu corpo é vau-de-rio
bandeira no horizonte é saia morta
que faz marruco (dizer) estripulia.
manuel carrega em pelo o horizonte
e sempre diz de ser belo vaqueiro.
quero dizer que manuelzão foi boi – VIII
se cada um valesse por cerrados
os bois, manuel, seriam mais velozes!
o cavalo, estreito no seu corpo,
seria sua roupa matinal.
os bois, manuel, são pura transcendência.
e o espaço que lhe sobra, pura noite,
diz, singela, gargantas de eloqüência
e nitidez velada, mão afoita
de ver facão vazado de espanto
coser a pele de homem e coser
o boi, manuel, revela cada encanto
que nosso corpo não cabe por caber.
vadio manuel estrada
vadio manuel daqui
manuel, estampa e gargalo,
manuel, estrago e
buscado saber da morte
por garrucha e devaneio
estrada é morte de outrem
cavalo, estrada e
estrada, manuel, tem morte
que nunca chega no fim
nos cabe o espanto da morte
(nos cabe a morte e o espanto)
quero dizer que manuelzão foi boi – VI
manuelzão bebeu, de sede,
02 águas de 02 rios.
amontado num pavio
virou augusto matraga.
quando bebe este quilate
manuel quase que late
destravado, tudo luz
de beber num arremate.
sua sede desmanchou
03 procela desabada
em viola, trupicou
fez o olho ser nascente.
arrancou melhor com o dente
que à faca. extasiado.
noite. sombra pelo rio
de manuel, largo e profundo
manuel, maior que o mundo,
bem menor que manuel
manuelzão desassombrado
pensando saber da vida
lambia cada cerrado
sombrava, pura alquimia.
na alma, cada bezerro.
no corpo, cavalo cada.
quero dizer que manuelzão foi boi – V
tenazes de manuel são como poldras
que sopram, juvenis, qualquer cidade.
manuel se faz de rubro cavaleiro
que carrega ademanes no seu ventre.
onde manuel latiu foi que se soube
do cão que travessava sua alma.
e por manuel se fez alma empenada.
o vento do facão recorta o mundo
em quadras. almas amenas,
duras espadas.
“se bezerro fosse noite
eu não mudava daqui”.
quero dizer que manuelzão foi boi – IV
este manuel é teso e o cavalo
(um) puro arreio que mistura o tempo.
viés de sua garganta traz garrucha
e valo de extensão desesperada.
sertão lhe vale quanto, o olho, o estado,
contém o corpo em gado, cada veia.
quando manuel se vê desesperado
é que montanha lhe redou o corpo
pela planura que sempre carrega.
quando manuel desdiz é que foi solto
o bicho contendor de uma vingança
vazada na garrucha e no ferrão.
quero dizer que manuelzão foi boi.
manuel se fez verdade por cavalo
o manuelzão foi o vaqueiro que conduziu o guimarães rosa pelo sertão de minas gerais. o rosa escreveu um livro sobre ele, “manuelzão”.
várias décadas depois nos tornamos amigos e viajamos muito, juntos. ele morreu em 1996, com 92 anos. falo sempre dele, o grande vaqueiro.
sua história é intensa. gosto de dizer que o guimarães rosa é um dos personagens do manuelzão.
quero dizer que manuelzão foi boi – III
ser boi, cone e pedal, pode ser grave
se em manuel remete antecedências.
o espaço que revelo é pura noite
de solidão, cerrado e eloqüência.
o árido instante, extrato e muro,
requer o olho atiçado: ventre
do galho traz mais decisões.
se o espaço brumoso de manuel
requer seja o cavalo puro intento
de reaver o tanto já perdido.
toda querela não cabe imensidão.
quero dizer que manuelzão foi boi – II
o texto é naufrágio e é silêncio.
quando da pedra salta-lhe uma cabra
seu dia contado vê-se rubro.
a pele vermelha do ar solta-se
em vigores. uma poesia carrega
sempre outra. cada grão avalia
o extrato como podre. querelas
são fontes de desejo. e os desejos,
noites.
preso dos olhos, manuel é cumieira.
quero dizer que manuelzão foi boi – I
declaração de princípios (manuelzão)
1 – “as coisas boas sempre vêm na memória. mas a ruim tá encostada de lado”.
2 –“quando o jiló ficar doce
quando o açúcar amargar
quando deus deixar o mundo
eu deixo de te amar.”
3- “nunca vi encruzilhada pro inferno.”
4 – “tudo ele queria saber a finalidade.”
5 – “a sobra que sobrou.”
6 – “eu nunca achei nada pouco
ou muito que chegasse pra mim.”
7 – “ela tava mais no rumo
de entender o que eu queria.”
8 – “sangue cuaiou, acabou.”
9 – “uma santinha dessa posição.”
10 – “a brincadeira saiu e rendeu demais.”
11 – “o negócio é todo às avessa.”
12 – “servia para lascar um pau-de-lenha.”
13 – “teve vez da barriga não caber.”
14 – “só acredito no que vejo.”
15 – “medo? num sei o que é medo.”
16 – “cão chupando manga.”
17 – “promete esse mundo e a metade do outro.”